segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Viver sem ar...

Todos os dias à noite, sempre que leio a tua carta digital de nove páginas, fico a sentir-me a pior pessoa do mundo. Não por aquilo de que me acusas, mas sim por interpretar cada frase, cada letra que foi escrita, com o rancor, a raiva, a frustração e o desespero com que as escreveste. Não quero com isto dizer que não tenhas razão... tens! Aliás, ninguém me conseguiu "ler" tão bem como tu o fizeste naquela carta. Cada palavra dói.
É por doer e fazer mossa que não deixo de a ler todos os dias antes de me deitar...
Foste a pessoa mais inteligente com quem me cruzei, sem qualquer dúvida. O carinho que me deste das vezes que estivemos juntos é inigualável! Isto para não falar da noite especial que foi quando te conheci... naquela data, não há um ano, um momento em que não me lembre de ti.
Aqui, em Portugal, ainda está a passar a novela I Love Paraisópolis... tem lá um personagem que me lembras tu, então não perco um episódio sempre na esperança de "te" ver. Aquele teu Brasil que também poderia ter sido o meu mas sem nunca o ser... saudades tuas.
Saudades das expressões "bundão", "bonitxinho", "amor, não dá pum não!" e até do sotaque Curitibano, do enrolar das palavras, tenho saudade.
Um dia, disse-te - e muito bem - que no meu blog só estavam lá escritas coisas que me marcaram... amores, desamores, pensamentos e desabafos... "culpaste-me" de nunca ter escrito nada sobre nós, ou seja, que não tinhas significado nada para mim. Não é verdade, aqui está a prova. Pode ter demorado, tempos infinitos, mas escrevo-o com gosto das memórias passadas contigo... da tua ternura, da tua ansiedade, dos teus beijos e do teu toque.
Não escrevo por descargo de consciência, não! Escrevo porque estarei imensamente arrependido de não ter dado o devido valor a quem tudo fez por mim e que chegou a abdicar do país natal para ficar comigo.
Sempre senti que eras a tal pessoa que me podia dar mais do que aquilo que me deram até hoje (e o que me deram, foi bom), sinto que podia ser mais.
Encho-me de orgulho do teu prémio em Milão... da tua dedicação ao que gostas de estudar e trabalhar, da tua maturidade e da fé que eu não tenho em Deus. Talvez os nossos caminhos se voltem a cruzar, não sei.
Este texto só faz sentido ser lido ao som de Mana, Vivir Sin Aire, título de tudo isto que te escrevo, com saudade, pena e em formato de desculpas.
Espero-te bem... 

Filipe Tiago Araújo  

sexta-feira, 22 de julho de 2016

O Grito duma Nação!

Portugal,10 de Julho de 2016...


A cidade de Valença do Minho desperta bem cedo e um longo dia se avizinha. Manhã de sol, dia bonito e a leve brisa conduz-nos até Bragança... Trás-os-Montes, onde o dia se inicia bem quentinho e o vento fraco nos leva até Braga, passando por Guimarães, correndo por Vila Real, Guarda e a tarde vai-se instalando e com ela já um pouco de ansiedade de um dia importante.

Almoçamos no Porto, comemos a sobremesa em Aveiro, passeamos por Coimbra e Castelo Branco, sem nunca esquecer Mirandela e Vilar Formoso... A tarde vai passando a velocidade de um relâmpago e, num ápice, estamos a lanchar em Lisboa. 
Com bastante pressa, vamos a Évora, corremos Beja e a voar estamos em Faro a petiscar algo. São 20h e à hora do apito inicial, encontramos-nos em Vila Real de Stº António, com o pensamento na Madeira e nos Açores, que lá ao longe, já roíam as unhas como todo um continente.

Um país parado, onde até os ladrões fizeram pausa durante 120 minutos, para ver o orgulho nacional a guerrear como se da batalha de Aljubarrota se tratasse! 
Na noite que tinha que ser nossa, fazia-se dia em Timor, a tempo de ver as lágrimas de ouro do nosso capitão que sairia do campo de batalha muito cedo... Paramos! Paramos todos! 11 milhões e mais alguns... quase que "deitamos a toalha ao chão" e, aquele dia que começou lindo em Valença e terminava em Vila Real de Stº António com muita esperança, parecia desvanecer-se com a dor no joelho do Cristiano.

Eles, lá bem distante, tinham os canhões todos apontados ao nosso Patrício que, valente e quase imortal, ia segurando as bombas com as mãos de ferro.
Raphäel, o verdadeiro Guerreiro, lançou um rocket que fez mossa no travessão do Lloris, o napoleónico capitão gaulês. A terra estremeceu! Foram mais de 11 milhões aos pulos, mas era falso alarme.
Aguentamos e aguentamos... O que eles não sabiam é que, mesmo sem o nosso Comandante, nós tínhamos uma arma secreta, daquelas que mais ninguém tem! O Patinho Feio, com a força de Eusébio, Camões e Amália e também de todos nós, disparou a bala mais importante da vida de todos nós e, para além de aniquilar o inimigo, fez explodir de alegria um país inteiro. "Éder! Éder! Éder!", era o som das vozes da RTP, Antena 1, TSF e Renascença... O grito mais lusitano de sempre! As lágrimas mais puras que há na vida e o sentimento mais belo do mundo... o de ser português!
Choramos abraçados ao desconhecido "conhecidamente" português que estava ao nosso lado a ver a bola... Chorou Valença, a roçar a Espanha, chorou Mirandela, Vilar Formoso, Odemira, Vila Real de Stº António, Açores, Madeira e um país inteiro que encheu praças, alamedas e avenidas... chorou Paris, Díli, Macau, Canadá, Suiça, Luxemburgo, Alemanha, EUA e desconfio que até no Bangladesh se derramaram as lágrimas da felicidade e de Portugal... em qualquer sítio onde haja um português, a festa era garantida!
Festejaram os que nos tiram tudo diariamente, desde o BE ao CDS/PP, os médicos nas urgências, a PSP, GNR, os ladrões, os advogados (vai dar quase ao mesmo), os reclusos, os padeiros, pasteleiros, lixeiros, empresários, desempregados, pretos, brancos, ciganos... tudo o que é e se sente português, tocou o céu.

10 de Julho de 2016, data que fica para a história... Portugal é Campeão da Europa de futebol!
Obrigado, muito obrigado!




Filipe Tiago Araújo

quinta-feira, 19 de maio de 2016

Alzheimer

Acordei como se fosse a primeira vez.
Olhei em redor e tudo me pareceu tão estranho e vazio... vazio de sentimentos, de espaço e de memória.
Seria uma autêntica tragédia se um dia acordasse e não me recordasse de ti! O que te dei, o que me deste, o que vivemos e o que vivi sem ti. 
Despertar e imaginar que não te chamo mais de amor ou que um dia tive um, seria como estar numa cama de hospital, a vegetar, à espera da minha hora. Talvez nada sentisse, talvez de nada (mesmo) me lembrasse... talvez.
Contudo, fecharia novamente os olhos na esperança de te encontrar no sonho mais profundo da minha alma e, por mais que o Alzheimer me apagasse a memória, jamais me esqueceria de ti... não há nada mais forte do que um coração puro e sincero, cheio de amor que dei e que recebi.
Podia até não reconhecer a casa onde morasse, as fotografias que visse, os relatos que invocassem à memória seletiva, mas uma coisa é certa, os teus olhos, o perfume da tua pele e cada curva do teu corpo eu jamais deitaria fora da minha cabeça!
O não me lembrar de muitas coisas, ajudaria a atenuar a dor daqueles que partiram e que deixaram saudades... bendito Alzheimer nessas alturas, pensaria eu ou... talvez não pensasse em nada.
Quem sou? Quem são vocês? Onde estou? O que faço aqui? ... Perguntas e mais perguntas!
O chip foi desligado, a vida virou merda e o sentido das coisas já não faz sentido. O silêncio vazio das memórias ocupa o espaço, agora opaco, deixado pela mente. Nada se situa, tudo ficou no esquecimento obrigatório, próprio da doença daqueles que não sabem quem são.
Não estou numa cama de hospital a vegetar... estou de olhos abertos a enfrentar o mundo com a nova dificuldade que este me colocou. Vejo, ouço mas não reajo! Castigo de Deus? Não sei... talvez sim, talvez não! Talvez seja esta a minha missão na Terra. Mas fará sentido? Uma missão da qual não me lembro ou me vou lembrar?!
Não deixei de ser quem sou, mas estou tão diferente que não me reconheço ou... não me lembro!
Aponto tudo certinho num caderno que dei o nome de Livro das Memórias, mas de que me serve se ao ler não me vou recordar de quando ou como foi que aconteceu?! É um pedaço de mim que ali está... e se não houver um pedaço de ti, ficará mais difícil de lembrar... mas sei que sempre estarás. E, no dia em que já nada reconhecer, chamar-te-ei de "Meu amor" e vou-te ver chorar, de alegria, de nostalgia (?), não sei... mas assim que te vir a derramar a água do nosso grande amor pela tua face, terei a certeza de quem és e quanto me fizeste feliz.

Filipe Tiago Araújo, 19.05.2016

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Noites de insonia


Esta é mais uma noite sem dormir...

Quando tu cais é assim que fico, eu, como muitos. Pode até já nem contar para nada... pode até ser a feijões, quando derrapas e tombas, tombas com estrondo.
Por muito que não te queira ajudar, porque me sinto triste, revoltado, impotente e incrédulo, a minha mão - por pouca força que tenha - estender-se-á sempre, para te agarrar e te puxar para cima.
Podes estar coberto de lama, do tropeção e da queda, mas por mais sujo que estejas há sempre alguém que te vai fazer reerguer, pôr-te a caminhar, correr e lutar.


Hoje, como te disse - e tal como a semana passada - o sono não vem tão cedo... pensando no que falhou, no que te fez cair e da maneira como caíste.

Contudo, não posso esquecer o que já me deste e o que, certamente, me darás no futuro. Muitas alegrias, lágrimas de felicidade, alguns dissabores (mas poucos) e muito orgulho naquilo que te tornaste.

Ajoelhei, aos prantos, em Sevilha quando o Derlei fez o 3º e nos fez levantar a Taça UEFA, em 2003. Gritei de alegria até a voz me falhar quando soou o apito final da Liga dos Campeões em 2004 e vi o Jorge Costa e o Vítor Baía a erguerem o "caneco", mas antes de tudo isso, no 2-0 (golo do Mágico Deco), o saudoso Jorge Perestrelo (TSF), disse: "...que bonito é, que bonito! Que bonito! As bandeiras estão desfraldadas ao vento... Nós queremos agradecer aos deuses do futebol, esta felicidade, que nos enche a alma, que põe um país parado, um país emocionado... é golo do Porto!", escrevê-lo é banal, ouvi-lo é arrepiante.
O minuto '92, bem... esse é indescritível! Desta vez, não ajoelhei, foi Jesus... mas chorei e chorei muito! Orgulho do remate do Kelvin bem no cantinho da rede, mas também pela garra, a entrega, a vontade de ganhar a que sempre me habituaste. Chorei, em delírio, a gritar bem alto e euforicamente em bom portuense: "Puartoooo! Puartooo! Puartooo!" ... vezes sem conta, longos minutos e orgulhosamente chorão, até ao final desse jogo que nos deu mais um título, frente ao eterno rival.
Antes, no tempo do "Jaime" - "... diz ao teu pai que lhe mando um beijo, foi o que ela disse!" - Rui Veloso dizia que era "voar como o Jardel sobre os centrais", mas em 2011 quem voou foi Falcao, em Dublin, para o único tento que nos levou à glória na Liga Europa. Aqui, como em todas as outras vezes, fui-te receber, de cachecol em punho, cantando por ti, contigo sempre até ao fim.
Ficam as boas memórias... ficam grandes memórias mesmo!
Hoje vejo-te triste, desalentado, sem a força e a garra de outros tempos. Mas por mais doente que estejas, por mais debilitado que te sintas, a verdade é apenas uma: NUNCA CAMINHARÁS SOZINHO! Se vais ao fundo do poço, eu mergulho e vou-te salvar ou fico lá contigo. És mais do que um clube, és uma razão de ser e de estar... ÉS PORTO! SOMOS PORTO! 

Filipe Tiago Araújo, 11.04.2016

sábado, 19 de março de 2016

3 letras apenas...

Porto, 19 de Março de 2016

O tempo passa e, com ele, apareceram os teus cabelos brancos... que ainda loiros, da cor do ouro, mostram o teu caráter, a tua dedicação e o exemplar comportamento de Pai.
A vida nunca nos foi fácil e, hoje em dia (mais do que nunca), lutamos para que no meio de tanta imperfeição tudo pareça perfeito! Com os defeitos de cada um e com os mesmos genes dos dois, os defeitos viram virtudes e motivo de orgulho. Passaste-me todos os valores mais humildes e nobres que um ser humano deve possuir... Ter compaixão, amor, empatia, solidariedade, entre outros... e por isso te estou muito grato.
Sabendo que não sou o melhor filho do mundo - com o azar de ser o único - cá vou tentando agradecer-te da melhor maneira (im)possível estes quase 32 anos de existência.
O tempo corre, como sempre, e não quero que seja em vão! Depois de se tentar superar uma grande perda (a do avô), tento e esforço-me para estar mais próximo daqueles que amo... e tu Pai, és o Homem que mais amo. Não sou muito bom a demonstrá-lo pessoalmente, eu sei, mas também estou ciente que o consegues ler nas entrelinhas.
É facto que depois dos 18 o tempo voa a uma velocidade relâmpago e o que fica do passado são mesmo as memórias e, acredita, tenho tantas nossas a passar na minha cabeça que nem imaginas. Com o tempo vou ficando com medo do que o futuro me reserva, nos reserva... mas um passo de cada vez será dado e tudo se resolverá, pensando sempre de maneira simples e positiva.
Aproveito o facto de hoje ser Dia do Pai para abrir o meu coração "ao mundo" e te dizer o que não pode ser dito mais tarde... e isso é o mesmo que dizer que te amo muito, muito mais do que possas imaginar. Nos momentos mais críticos da minha vida (e da tua também) estiveste sempre ao meu lado, mesmo quando em assuntos mais delicados para um homem, tudo fazia crer no contrário.... mas não! Foste a força que me faltou naqueles dias e estarei eternamente grato a ti por esses motivos.
A amizade e o amor são dois sentimentos muito bonitos de serem vividos e obrigado a ti, uma vez mais, por sentir de tua parte tão belas emoções.

Com amor, do teu filho...
Filipe Tiago Araújo  

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Perdidos...

Vivemos muitos anos e, quanto mais vivemos, mais memórias ficam na nossa cabeça. Vivemos de memórias e da memória... Temos sempre histórias para contar, outras vidas para viver, vivendo o passado, o presente e a pensar já no futuro. 
Fica a pergunta: E se um dia a nossa memória se apagasse?
Certamente não seria o fim do mundo... mas seria viver desumanamente, sem saber quem somos, o que fazemos aqui e outras tantas perguntas que ficariam sempre sem resposta pela ausência do pedacinho que nos mexe com as emoções e não, não é o coração... chama-se memória.
Ter vivido toda uma vida, tenha ela sido feliz ou não, e de nada ou muito pouco nos lembrarmos é sôfrego, triste e reduz-nos àquilo que todos somos, NADA!
Não é por estarmos em meados do dia de S. Valentim, de todo, mas nunca se esqueçam de viver um dia de cada vez... como se fosse o último. Amam quem vos ama, cometam as maiores loucuras e sejam felizes, porque de um dia para outro podemos não saber quem está ao nosso lado, quem tanto amamos e por aquilo que sempre lutamos. Não basta viver apenas, temos que, sobretudo, sentir!
Sentir o quanto e aquilo que a vida nos dá.
Viver na ausência da memória é o mesmo que estar em modo vegetativo, no vazio do tempo, parados na solidão e da confusão de quem somos e onde estamos, para onde vamos... Não sei se se sofre mas sei que um dia Amália Rodrigues fez do silêncio um grito e creio ser esse mesmo grito que faz doer todo um corpo que não passa disso mesmo... um corpo, apenas um corpo.
Deslizar um lágrima pela face sem sabermos o porquê, rir sem sabermos de quê e pensar é impensável na ausência do que nos faz viver para além dos batimentos do coração... a memória.

Filipe Tiago Araújo, 11.02.2016